Era uma vez uma menina de 16 anos, que resolveu criar um blog para desabafar... E que agora, aos 21, continua a escrever. De teen a adulta; de Portugal à Holanda - A saga!

11
Mar 09

Ora, muito boas noites!

 

Quer-me a mim parecer que tenho aqui o estaminé um bocadinho abandonado. O problema é que, com os projectos para a faculdade (que, diga-se de passagem, não são poucos), com o clube de futebol, com o exames a chegar, com a minha nova e reforçada vontade de aprender a tocar viola em vez de a ter aqui só para enfeitar o quarto... Enfim, no meio disto tudo, acabo por não ter tempo para quase mais nada.

 

Mas hoje tive cá vir, contar-vos algo que me aconteceu hoje.

 

Hoje fui, com a minha turma, a uma "Clinical Session". A Clinical Session consiste em irmos a uma clínica, hospital ou centro de reabilitação. onde nos espera um paciente. Quando lá estamos, somos divididos em quatro grupos: um para decidir que perguntas fazer, outro para avaliar a condição do paciente, outro para mostrar um possível tratamento e outro para, no fim, escrever um relatório.

Cada grupo decide o que tem a decidir e uma pessoa de cada grupo demonstra o que o grupo decidiu.

 

Hoje, depois de umas trocas e baldrocas entre grupos, lá me calhou a mim fazer as perguntas ao paciente.

O senhor G., vítima de um AVC há cerca de quatro meses, surgiu numa cadeira de rodas e com um sorriso na cara. Segundo a fisioterapeuta que nos estava a acompanhar, o sorriso devia-se, não só ao facto de ver caras novas e uma camara de filmar apontada na sua direcção (que, diga-se de passagem, o senhor adorou!), mas ao belo do expresso que tinha acabado de beber (ao que parece, a hora do Expresso é a hora preferida do Sr. G.).

 

Geralmente, as clínicas tentam arranjar pacientes que falem inglês, visto que nenhum de nós é fluente em holandês. Não foi o caso de hoje: o senhor não sabia uma palavra de inglês. Felizmente, o senhor é, de origem, espanhol e, apesar de viver na Holanda há coisa de 50 anos, conseguiu perceber perfeitamente o meu "portunhol".

 

Nós estudámos os Acidentes Vasculares Cerebrais e os seus efeitos mas, ao que parece, há um que, ou me escapou, ou não estava documentado: o facto de o senhor não conseguir controlar as emoções.

Bastou eu começar a perguntar sobre o que tinha acontecido, para o senhor se desmanchar em lágrimas, a dizer que quer voltar para casa (leia-se Madrid), que quer ficar bom.

 

Opá, vocês sabem como eu sou! Sou forte e tudo e tudo, mas... Pronto, não aguentei! Dei-lhe um abraço (claro que perguntei primeiro se podia), palmadinhas nas costas, festinhas na cara, e só não lhe dei um rim porque o senhor não me pediu!

 

É daquelas coisas que eu sei que vem com o tempo e a experiência, mas ver aquele senhor tã abatido doeu-me tanto, quase como se fosse um familiar meu!

 

A fisioterapeuta que estava comigo lá me explicou que o senhor não consegue controlar as lágrimas e que, se eu continuasse a abraçá-lo e tudo isso, o choro nunca mais parava. Tentei então, durante o resto das perguntas, manter a "distância". Claro que lhe disse coisas que provavelmente nunca vão acontecer mas que sei que o confortaram na altura (e a fisioterapeuta não pode fazer nada porque não fala uma palavra de espanhol; só entendia o que eu traduzia, e eu só traduzia o que queria).

 

Quando acabei as perguntas, o senhor G. disse-me que, por ele, podia fazer-lhe mais mil perguntas, que não se importava. Quando lhe disse que outros colegas iam agora examiná-lo e sugerir algumas formas de tratamento, o senhor G. disse-me que já nos considerava família.

 

Em menos de três horas, aquele senhor já nos considerava família. Em menos de três horas...

 

Quando lhe disse que olhasse para a camara e sorrisse, para ficar bonito na TV, ele brindou-nos com um sorriso de orelha a orelha. Digam o qu disserem, foi o sorriso mais bonito que já vi e, de certeza, um sorriso que jamais irei esquecer.

 

E espero, sinceramente, ir um dia a Madrid e, nalgum parque, sentado num banquinho, ver o senhor G.

Porque o seu sonho é voltar a Madrid, para ver a família. Porque o seu maior desgosto foi não ter passado o Natal com a família.

 

Porque, apesar de existirem milhares de Srs. G. espalhados pelo mundo, este tocou-me de forma muito, muito especial.

 

As melhoras, Sr. G! Y mucha, mucha suerte!

publicado por Nana às 21:09
música: Dare you to move
sinto-me: com um nó na garganta

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